Sua ausência

Me falaram que você está indo embora. Para um lugar tão distante quanto o vão que existe entre nós quando estamos cara a cara.

Não, eu não estou louca. Sei que foi você quem me contou. É que eu não te reconheço mais. Quando me falou que estava de partida não consegui compreender. Para mim você se foi há muito tempo.

Eu não sei exatamente quanto tudo isso aconteceu. Acredite. Se eu pudesse, eu teria impedido.

Eu queria muito poder te resgatar. Mas eu também me perdi de mim mesma. No momento em que você se foi. Quando tudo deixou de existir. Quando eu deixei de sentir. Quando eu não pude mais ver. Quando eu me vi sem você. Sozinha. Ainda que você estivesse aqui. Do meu lado, bem longe de mim. 

Um novo adeus

E agora, assim, meio que de repente, você está indo embora. Eu já havia me despedido de você uma vez. No meio do breu daquela madrugada eu olhava no fundo de seus olhos. Tentava te explicar o motivo da partida que nem eu mesma sabia. As lágrimas, que tanto se escondiam (e se escondem) dentro de mim, escapavam. Eu queria ter te dito tanta coisa. Eu queria ter te feito tanta coisa. Eu queria ter sentido tanta coisa. Se eu não gostasse tanto de você, talvez eu tivesse tentado. Não fui capaz. E em meio toda aquela neblina eu parei. Agora, aqui, tento me encontrar. Busco a explicação que eu queria ter te dado há um tempo atrás. Antes de você ter aparecido na minha vida eu era apenas um violão de quatro cordas. Eu era uma linda e rouca voz. Eu era belas palavras; embaralhadas e sem sentido. Você me mostrou tanta coisa. A gente viveu tanta coisa. Não me arrependo de nada. Minha frustração foi não ter conseguido.

Apenas esse

Quem diria que eu me tornaria merecedora da sua raiva? Sinto-me lisongeada. Sim, afinal você nunca demonstrou nenhuma espécie de sentimento por mim. Suas palavras sempre tão lindas. Suas atitudes sempre tão contraditórias. O mais irônico é que eu, com toda minha frieza, sempre te aqueci com o calor dos meus braços. E você, com todo o seu romantismo, se tornou uma balde de água fria sobre a minha cabeça. Eu sei que agora, perplexo e incrédulo, você se pergunta como eu seria capaz de te tratar com tamanha indiferença. Então você procura. Procura nas minhas palavras uma brexa, uma vírgula que possa relacionar a você. Mas não  se dê ao trabalho. Do que falo, do que escrevo, relacionado a você, apenas os pontos finais.

Aí pronto. E acabado!

Acho engraçada a forma como as pessoas reagem a términos de relacionamento. A gente sempre acha que depois da primeira desilusão amorosa nunca mais vai sentir aquilo. Até que vem o próximo, e o próximo, e o próximo. Quando se dá conta, já perdemos a conta de amores e desamores.

Cheguei a conclusão que dor de término de namoro é como a dor do parto. Você tem certeza que não vai aguentar. Tudo que mais deseja é muita, mas muita, morfina na veia pra suportar aquelas pontadas que parecem que vão te destruir por dentro. Surpreendentemente, com o tempo, se esquece da dor. Até que, de repente, vem o próximo filho da puta (no caso da dor do parto apenas “filho”) e você sente de novo uma dor absurda (e é claro, como se fosse a primeira vez).

A verdade é que término de namoro é sempre complicado. E, se não estiver tão complicado, a gente tem o prazer de complicar. No fundo, término de namoro dá muito pano pra manga. E, inegavelmente, nós, seres humanos, mortais, malucos, curtimos essa novela. “Coitado de mim, levei um pé na bunda”. “Coitado de mim, dei um pé na bunda”. "Coitado de mim, tive que dar um pé na bunda porque nem pra isso aquele imbecil serve". Nunca ninguém está satisfeito.

Quando nós terminamos, questionamos se estamos fazendo a coisa certa. Somos taxados de destruidores de coração, egoístas, burros e vamos terminar sozinhos por causa disso.
Quando somos terminados, o mundo cai, o orgulho fere, o cotovelo dói. Somos coitadinhos e merecemos alguém melhor. Vamos dar a volta por cima e encontrar um bonzinho que nos faça bem.

Mas é inquestionável que pé na bunda é o que há pra quem está afim de curtir aquela fossa. Coloque uma musica da Adele no Ipod. Tranque a porta do quarto. Fique no escuro. Não atenda ninguém. Veja fotos antigas e corte os pulsos.

Aí pronto. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados e pulsos cortados.
Mas não para por aí. Você não quer passar de coitadinho. Se deixar derrotar? Jamais! Afinal você é muito melhor do que ele.

Hora de ir para a noitada. Você vai desenterrar as companhias da sua época de solteiro. Pronto. Tudo combinado. Você e a galera hoje vão fazer história. Galerona maneira (você não conhece nem a metade). Momento de perdição de linha, sequelação geral. Uma caipirinha! Duas! Três! Tequila! Absinto! Bebida até que o seu fígado chegue ao nível do seu coração.

Aí pronto. Os dois estão destruídos. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, com um fígado que não funciona e nesse momento você já não lembra porque estava naquela boate com o... com o... qual é mesmo o nome dele?

Mas não para por aí. Você liga para a sua amiga completamente embriagada. Conta que pegou o fulano, mas está se sentindo meio mal. Ela, que já estava quase dormindo, te aconselha: "Amiga, ele é muito gato! Mandou bem. Não fica assim não. Fica bem e toma uma bebida por mim. O beltrano morreria se soubesse que você ficou com ele".

Momento de glória! Você bebe mais e se força a gostar do beijo-mais-ou-menos que aquele gostosão está te dando. Mais Vodka, cerveja, Red bull. Inevitavelmente aquela música-nada-apropriada toca. Você chora escondido no banheiro por alguns minutos. O sofrimento transforma-se em raivam e você, com sede de vingança, volta para a pista para seu momento de "glória”.

Hora de acordar. Você olha para o despertador. 15:00h. Cara de derrota. Dor de cabeça. Um balde de sobreaviso ao lado da cama (vazio, pelo menos). Você não se lembra como e com quem chegou em casa. Fica se questionando como foi parar na sua cama e como suas roupas estavam espalhadas pelo chão.

Aí pronto. Coração e fígado destruídos. Você está fodido (talvez, literalmente). Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, ressaca alcóolica e moral e, para completar, um roxo enorme na perna que você não tem idéia de onde veio.

Você levanta da cama. Toma um banho e um Engov. Comer, nem pensar! Resolve ver as fotos. Momento “vergonha própria”. Mas você estava linda no início da noite. Hora de postar as fotos e comentários “entrelinhas” mais idiotas para despertar a curiosidade do filho da puta do seu ex, que não teve coragem de deletar do seu facebook. Você, hipocritamente, escreve de um jeito obvio que ficou com aquele cara na noite anterior, dizendo “eu não sabia que dava para perceber”.

Seu telefone apita. Mensagem de texto. Você corre ao telefone esperando que fosse alguém capaz de te contar e rir da noite anterior. E você lê “Eu amei ontem a nossa noite. Não devia ter te ligado bêbado para nos encontrarmos. Mas é que eu não aguentei de saudade. Sei que você ficou com outra pessoa antes. Não precisava ter mentido pra mim. Eu entendo você querer ficar com outras pessoas. Eu também já fiquei. Sem ressentimentos. Sei que se for para ficarmos juntos, nós vamos ficar. Nos vemos por aí. ;)” .

Aí pronto. Coração e fígado destruídos. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, ressaca alcóolica e moral, um roxo enorme na perna que você não tem idéia de onde veio. Se sentindo uma fracassada. Tomada pelo ódio mortal daquele babaca que se aproveitou de você quando você estava bêbada e te mandou uma conversa fiada por mensagem de texto. Com mais ódio ainda daquela carinha feliz que ele mandou no fim da mensagem. Quem ele está pensando que é?

Você chora de dor, raiva, amor e ódio. Você tem a certeza de que aquela dor nunca vai passar. Mas vai. Sempre passa.

Agora eu entendo

Adeus, e foi embora. Não olhou para trás. Para frente, também não. Pegou o meu coração, dilacerado, e levou no bolso. Sem dó. Sem piedade. Sem pedir. Fazia algum tempo que ensaiava a partida. Não pensei que esses ensaios, tão dolorosos, tornariam-se um show de horrores em que a platéia era apenas eu. Sentia um gosto amargo, das lágrimas que fogiam dos meus olhos em direção ao canto da minha boca.

Eu pensava que o problema era somente você, quando na verdade o problema também era eu (ou apenas eu). Eu, que não conseguia enxergar o que estava na minha cara. Agora eu acho graça. Graça da desgraça que tornei a minha vida por não ter querido enxergar o que eu não preciso nem abrir os olhos para ver. Basta sentir.

O pranto que me invadiu e me derrotou foi o mesmo que tomou conta de mim e me libertou. Me livrou dessa tormenta. E agora você transborda para fora de mim e desce pelo ralo abaixo.

Hoje, eu me sinto livre. Meu corpo, antes pesado, flutua, sereno.

Hoje, o sol nasceu especialmente pra mim. Eu, sem perceber, abri os olhos e sorri para a luz que entrava sorrateira por baixo da cortina. Me espreguicei, sem preguiça de levantar da cama. Sem medo de abrir os olhos e encarar a vida e os fatos. Saltetando pelo quarto. Sem motivos específicos para sorrir. Sem motivos para chorar. Celebrando a minha vida e os meus recomeços. Agradecendo pelos tropeços que me fizeram ser quem sou nessa manhã.

O nosso amor

Eu já tinha esquecido que quando você se aproxima, alguma coisa faz com que meu corpo queira abraçar o seu. Te sentir. Sentir o sopro da sua respiração no meu rosto. Eu já tinha me esquecido desse sentimento tão incomum e desconhecido. Eu já tinha esquecido da forma que você sorri, simplesmente por estarmos lado a lado, só eu e você. Eu já tinha esquecido que eu não preciso lembrar do nosso amor para te amar. O nosso amor a gente guarda. De vez em quando. Mas, as vezes, de repente, a gente tira ele da gaveta. E se ama. O nosso amor é assim. É diferente. É latente. É bonito. É grandioso. É único. É momentâneo, mas também eterno. O nosso amor é uma vontade que vem do nada. Que a gente não controla, que a gente esconde. É a vontade de estar junto o tempo todo, mesmo que o tempo todo não seja todo o tempo. O nosso amor é amar tanto, que a gente prefere guardá-lo para que ele nunca acabe, ainda que tenhamos certeza da imortabilidade de nosso louco e inexplicável amor.

Meu eu de hoje

Livre pra ser o que eu quiser, mesmo sendo muitas coisas, procuro em minha liberdade alguma coisa pra eu ser. A vida é uma incansável busca. Ainda que seja uma busca por algo a se buscar. Luta contra o luto. Luta contra a solidão que aparece em um certo minuto. Busca por nós mesmo em meio a uma multidão que nos esconde. O encontro de nós mesmo, que nos desencontramos de alguns dos muitos eus que somos feitos. A vida é uma constante redescoberta. Um inesgotável e eterno recomeço.