Apenas esse

Quem diria que eu me tornaria merecedora da sua raiva? Sinto-me lisongeada. Sim, afinal você nunca demonstrou nenhuma espécie de sentimento por mim. Suas palavras sempre tão lindas. Suas atitudes sempre tão contraditórias. O mais irônico é que eu, com toda minha frieza, sempre te aqueci com o calor dos meus braços. E você, com todo o seu romantismo, se tornou uma balde de água fria sobre a minha cabeça. Eu sei que agora, perplexo e incrédulo, você se pergunta como eu seria capaz de te tratar com tamanha indiferença. Então você procura. Procura nas minhas palavras uma brexa, uma vírgula que possa relacionar a você. Mas não  se dê ao trabalho. Do que falo, do que escrevo, relacionado a você, apenas os pontos finais.

Aí pronto. E acabado!

Acho engraçada a forma como as pessoas reagem a términos de relacionamento. A gente sempre acha que depois da primeira desilusão amorosa nunca mais vai sentir aquilo. Até que vem o próximo, e o próximo, e o próximo. Quando se dá conta, já perdemos a conta de amores e desamores.

Cheguei a conclusão que dor de término de namoro é como a dor do parto. Você tem certeza que não vai aguentar. Tudo que mais deseja é muita, mas muita, morfina na veia pra suportar aquelas pontadas que parecem que vão te destruir por dentro. Surpreendentemente, com o tempo, se esquece da dor. Até que, de repente, vem o próximo filho da puta (no caso da dor do parto apenas “filho”) e você sente de novo uma dor absurda (e é claro, como se fosse a primeira vez).

A verdade é que término de namoro é sempre complicado. E, se não estiver tão complicado, a gente tem o prazer de complicar. No fundo, término de namoro dá muito pano pra manga. E, inegavelmente, nós, seres humanos, mortais, malucos, curtimos essa novela. “Coitado de mim, levei um pé na bunda”. “Coitado de mim, dei um pé na bunda”. "Coitado de mim, tive que dar um pé na bunda porque nem pra isso aquele imbecil serve". Nunca ninguém está satisfeito.

Quando nós terminamos, questionamos se estamos fazendo a coisa certa. Somos taxados de destruidores de coração, egoístas, burros e vamos terminar sozinhos por causa disso.
Quando somos terminados, o mundo cai, o orgulho fere, o cotovelo dói. Somos coitadinhos e merecemos alguém melhor. Vamos dar a volta por cima e encontrar um bonzinho que nos faça bem.

Mas é inquestionável que pé na bunda é o que há pra quem está afim de curtir aquela fossa. Coloque uma musica da Adele no Ipod. Tranque a porta do quarto. Fique no escuro. Não atenda ninguém. Veja fotos antigas e corte os pulsos.

Aí pronto. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados e pulsos cortados.
Mas não para por aí. Você não quer passar de coitadinho. Se deixar derrotar? Jamais! Afinal você é muito melhor do que ele.

Hora de ir para a noitada. Você vai desenterrar as companhias da sua época de solteiro. Pronto. Tudo combinado. Você e a galera hoje vão fazer história. Galerona maneira (você não conhece nem a metade). Momento de perdição de linha, sequelação geral. Uma caipirinha! Duas! Três! Tequila! Absinto! Bebida até que o seu fígado chegue ao nível do seu coração.

Aí pronto. Os dois estão destruídos. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, com um fígado que não funciona e nesse momento você já não lembra porque estava naquela boate com o... com o... qual é mesmo o nome dele?

Mas não para por aí. Você liga para a sua amiga completamente embriagada. Conta que pegou o fulano, mas está se sentindo meio mal. Ela, que já estava quase dormindo, te aconselha: "Amiga, ele é muito gato! Mandou bem. Não fica assim não. Fica bem e toma uma bebida por mim. O beltrano morreria se soubesse que você ficou com ele".

Momento de glória! Você bebe mais e se força a gostar do beijo-mais-ou-menos que aquele gostosão está te dando. Mais Vodka, cerveja, Red bull. Inevitavelmente aquela música-nada-apropriada toca. Você chora escondido no banheiro por alguns minutos. O sofrimento transforma-se em raivam e você, com sede de vingança, volta para a pista para seu momento de "glória”.

Hora de acordar. Você olha para o despertador. 15:00h. Cara de derrota. Dor de cabeça. Um balde de sobreaviso ao lado da cama (vazio, pelo menos). Você não se lembra como e com quem chegou em casa. Fica se questionando como foi parar na sua cama e como suas roupas estavam espalhadas pelo chão.

Aí pronto. Coração e fígado destruídos. Você está fodido (talvez, literalmente). Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, ressaca alcóolica e moral e, para completar, um roxo enorme na perna que você não tem idéia de onde veio.

Você levanta da cama. Toma um banho e um Engov. Comer, nem pensar! Resolve ver as fotos. Momento “vergonha própria”. Mas você estava linda no início da noite. Hora de postar as fotos e comentários “entrelinhas” mais idiotas para despertar a curiosidade do filho da puta do seu ex, que não teve coragem de deletar do seu facebook. Você, hipocritamente, escreve de um jeito obvio que ficou com aquele cara na noite anterior, dizendo “eu não sabia que dava para perceber”.

Seu telefone apita. Mensagem de texto. Você corre ao telefone esperando que fosse alguém capaz de te contar e rir da noite anterior. E você lê “Eu amei ontem a nossa noite. Não devia ter te ligado bêbado para nos encontrarmos. Mas é que eu não aguentei de saudade. Sei que você ficou com outra pessoa antes. Não precisava ter mentido pra mim. Eu entendo você querer ficar com outras pessoas. Eu também já fiquei. Sem ressentimentos. Sei que se for para ficarmos juntos, nós vamos ficar. Nos vemos por aí. ;)” .

Aí pronto. Coração e fígado destruídos. Você está fodido. Orgulho ferido, cotovelos machucados, pulsos cortados, ressaca alcóolica e moral, um roxo enorme na perna que você não tem idéia de onde veio. Se sentindo uma fracassada. Tomada pelo ódio mortal daquele babaca que se aproveitou de você quando você estava bêbada e te mandou uma conversa fiada por mensagem de texto. Com mais ódio ainda daquela carinha feliz que ele mandou no fim da mensagem. Quem ele está pensando que é?

Você chora de dor, raiva, amor e ódio. Você tem a certeza de que aquela dor nunca vai passar. Mas vai. Sempre passa.

Agora eu entendo

Adeus, e foi embora. Não olhou para trás. Para frente, também não. Pegou o meu coração, dilacerado, e levou no bolso. Sem dó. Sem piedade. Sem pedir. Fazia algum tempo que ensaiava a partida. Não pensei que esses ensaios, tão dolorosos, tornariam-se um show de horrores em que a platéia era apenas eu. Sentia um gosto amargo, das lágrimas que fogiam dos meus olhos em direção ao canto da minha boca.

Eu pensava que o problema era somente você, quando na verdade o problema também era eu (ou apenas eu). Eu, que não conseguia enxergar o que estava na minha cara. Agora eu acho graça. Graça da desgraça que tornei a minha vida por não ter querido enxergar o que eu não preciso nem abrir os olhos para ver. Basta sentir.

O pranto que me invadiu e me derrotou foi o mesmo que tomou conta de mim e me libertou. Me livrou dessa tormenta. E agora você transborda para fora de mim e desce pelo ralo abaixo.

Hoje, eu me sinto livre. Meu corpo, antes pesado, flutua, sereno.

Hoje, o sol nasceu especialmente pra mim. Eu, sem perceber, abri os olhos e sorri para a luz que entrava sorrateira por baixo da cortina. Me espreguicei, sem preguiça de levantar da cama. Sem medo de abrir os olhos e encarar a vida e os fatos. Saltetando pelo quarto. Sem motivos específicos para sorrir. Sem motivos para chorar. Celebrando a minha vida e os meus recomeços. Agradecendo pelos tropeços que me fizeram ser quem sou nessa manhã.

O nosso amor

Eu já tinha esquecido que quando você se aproxima, alguma coisa faz com que meu corpo queira abraçar o seu. Te sentir. Sentir o sopro da sua respiração no meu rosto. Eu já tinha me esquecido desse sentimento tão incomum e desconhecido. Eu já tinha esquecido da forma que você sorri, simplesmente por estarmos lado a lado, só eu e você. Eu já tinha esquecido que eu não preciso lembrar do nosso amor para te amar. O nosso amor a gente guarda. De vez em quando. Mas, as vezes, de repente, a gente tira ele da gaveta. E se ama. O nosso amor é assim. É diferente. É latente. É bonito. É grandioso. É único. É momentâneo, mas também eterno. O nosso amor é uma vontade que vem do nada. Que a gente não controla, que a gente esconde. É a vontade de estar junto o tempo todo, mesmo que o tempo todo não seja todo o tempo. O nosso amor é amar tanto, que a gente prefere guardá-lo para que ele nunca acabe, ainda que tenhamos certeza da imortabilidade de nosso louco e inexplicável amor.

Meu eu de hoje

Livre pra ser o que eu quiser, mesmo sendo muitas coisas, procuro em minha liberdade alguma coisa pra eu ser. A vida é uma incansável busca. Ainda que seja uma busca por algo a se buscar. Luta contra o luto. Luta contra a solidão que aparece em um certo minuto. Busca por nós mesmo em meio a uma multidão que nos esconde. O encontro de nós mesmo, que nos desencontramos de alguns dos muitos eus que somos feitos. A vida é uma constante redescoberta. Um inesgotável e eterno recomeço.

Razões irrazoáveis

As pessoas sempre procuram razão para tudo.
Se você escreve de amor, tá amando.
Se escreve de ódio, tá com o orgulho ferido.
Se escreve indiferente, tá amargurada.
E se escreve feliz, tá mentindo.

Hoje eu te vi

Hoje eu te vi passando. Estava longe. Te observei. Não tinha nada para te falar, por isso não me movi. Aliás, não tinha como me mover, por isso nada falei. Agora eu resolvi te escrever. Agora eu resolvi por no papel o que não consegui  proferir diante da sua cara lavada. Aqui escrevo. Mas hoje, eu não quero poesia. Eu quero ser fria. Quero dizer, de forma desorganizada, nada romântica, que você é uma pedra no meu sapato. Quero dizer, de forma clichê, como você é clichê. Não preciso me encher de inspiração para mandar você ir a merda. Vai a merda é uma expressão que se satisfaz por ela mesma e dispensa qualquer espécie de lirismo. Não está nada bonito, não é? Mas é exatamente isso que você merece. Uma mensagem pequena para uma pessoa pequena. Hoje eu vou rir da sua cara. Aquele riso de deboche que você odeia. Vou sentar e assistir a queda do seu chamado império. Agora eu consigo perceber what a loser you are. Em uma competição com você mesmo, você perderia. É patética a forma que você se gaba com o seu jeitinho nada demais. Baixe o seu ego. Você vai se afogar na sua pretensão. Dessa vez eu não estarei lá para te acudir.

Instrospecção

E no silêncio do meu quarto me deparo diante de mim mesma. Sinto como se estivesse passando por uma neblina. Concentro-me para tentar enxergar. Sinto medo, pois não consigo ver o caminho. Sei que há curvas mas não sei para que lado virar.
Então, paro no acostamento. Não procuro mais respostas. Procuro um ponto de equilíbrio. Eu poderia me arriscar. Continuar na estrada e aventurar-me passando em meio a neblina. Talvez encontrasse uma linda vista a minha espera. Mas a razão me faz parar. Afinal, acidentes na estrada são comuns, não é? Sei que as vezes, por uma milagre de Deus ou simplesmente sorte, saímos ilesos. Mas não posso e não quero correr o risco de machucar ninguém.  
Vou ficar aqui. Dentro do carro. Até que a neblina vá embora e eu possa continuar o meu caminho. Sem riscos, sem medo, sem dúvida. A espera pode ser, ou é sempre, dolorosa. Mas eu aguento. E quando o momento de partir chegar, arrancarei com o carro. Com os vidros abertos e o ar puro soprando meu rosto. Aproveitarei cada segundo da estrada. E quando a linda vista aparecer, eu saberei que a espera valeu a pena.

Lembra?

Lembra aquele dia? Você se deparou diante de mim e se desconcertou com a minha presença. E, com um jeito intimidado, tentava puxar um assunto balela, que me fazia rir e me encantar com o seu jeito meio bobalhão.

Lembra aquele dia? Você sussurrava em meu ouvido que eu estava linda, que me queria só pra você, convencendo-me de que eu deveria ser apenas sua.
Lembra aquele dia? Você partiu por alguns dias, que pareciam a eternidade, me fazendo ser consumida pela saudade e desejo de estar ao seu lado.
Lembra aquele dia? Você me levou pra sua casa. Me beijou de um jeito que ninguém havia beijado. Colocou as mãos no meu rosto sem deixá-lo se afastar de seu corpo. Fez com que eu delirasse por alguns minutos naquele sofá, silenciosamente, sem que ninguém percebesse.
Lembra aquele dia? Nos abraçávamos no carro, sem falar nada. O silêncio era interrompido pelo barulho de nossa respiração e da música que tocava bem baixinho ao fundo.
Lembra aquele dia? Seu sorriso estava mais lindo do que nunca. A felicidade estampava-se em sua face. A noite, as pessoas, a música ao redor, não tinham a menor graça. Me bastava te olhar, olhando nos meus olhos, cantando aqueles versos tão clichês para mim. Me bastava sentir você chegando cada vez mais perto. Seu corpo, balançando levemente contra o meu, no ritmo da música. Suas mãos enroscadas por entre os meus cabelos, acariciando-os e puxando-os levemente ao mesmo tempo.
Lembra aquele dia? Era domingo e assistíamos ao futebol na televisão. Você se concentrava no jogo e me fazia carinho. Eu, embora estivesse olhando para aquela chatice futebolística, só prestava atenção na forma que seu dedo ia e voltava, sutilmente, acariciando minha mão. Só prestava atenção no seu perfume, que penetrava para dentro de mim dando-me uma vontade louca de te beijar.
Lembra aquele dia? Sua boca disparou em minha direção: “eu te amo”. Me fez perder o chão, me fez perder o prumo. Me fez perder o fôlego, perder o rumo. Me deixou com um sorriso que ia de orelha a orelha e acelerou meu coração de uma maneira que não sabia ser possível.
Lembra aquele dia? Você me amou, me desejou, me fez e foi feliz ao meu lado.
Eu não preciso lembrar. Eu nunca esqueci.

Pensamento

Penso no amanhã. Penso no agora.
Penso a qualquer tempo. Penso toda hora.
Penso no que é certo. Penso no que é errado.
Penso no que espero e no inesperado.

Penso no amor e na profissão.
Penso sem saber, ou com convicção.
Penso no caminho. Penso na jornada.
Penso, se sozinha. Penso acompanhada.

Penso no tudo.
Penso no nada.
Penso na vida.
Penso na estrada.

Penso em qualquer coisa.
Penso em coisa alguma.

Penso, penso, penso,
E não chego a lugar nenhum.

Divã

Minhas incertezas, medos e frustrações me consumiam. – Alô? Gostaria de marcar uma consulta. Lá estava eu a caminho do Jardim Botânico. Nervosismo. Curiosidade. Chego. Sento no sofá. Blá, blá, blá, até que as verdades, ou apenas a verdade, pulasse para fora de mim. Naquele momento ela entrou na minha vida.

Toda semana era assim. Eu falando de uma desconhecida (eu mesma) para outra desconhecida (ela). Com o tempo fomos nos conhecendo melhor. Eu, conhecia a mim mesma. Ela, conhecia a mim. Eu, era dor e medo. Ela, cumplicidade e segredo.

A cadeira em que sentava, antes desconfortável, foi tornando-se praticamente uma nuvem do céu. Ao sentar me sentia como se estivesse ouvindo a voz dos anjos.

Anjo desconhecido, enviado por Deus. Não sabia de onde ela vinha, do que gostava. Se preferia cinema ou teatro. Se era louca, se era santa. Adulta, criança. Mas havia coisas que eu sabia. Sabia a cara que fazia quando estava surpresa. A forma que seus olhos me diziam que eu estava fazendo tudo errado. Sabia a maneira que ria quando achava algo engraçado e a expressão de seu rosto quando queria me dizer que ia ficar tudo bem.

Aquele ponto de interrogação que sentava-se diante de mim transformou-se no meu Prozac, meu Dormonid. Por mais que não a conhecesse, sabia do bem que me fazia.

A ela agradeço por ter me feito inúmeras perguntas que não soube responder. Por ter enxugado minhas lágrimas mesmo quando não escorregavam pelo meu rosto. Ou, tê-las enxugado, mesmo que de longe, quando não se continham dentro dos meus olhos. Agradeço por ter acalmado meu coração quando eu sentia que ia explodir dentro de mim; e tê-lo reconstruído quando se quebrou em mil pedaços. Agradeço por ter me entendido mesmo quando as palavras saíram desordenadas de minha boca e, querendo dizer alguma coisa, eu não dizia nada. Agradeço por simplesmente iluminar minha estrada todos os dias.

Há quem diga que ser anjo da guarda é apenas uma profissão. Para mim, é uma dádiva, um presente (presente meu, é claro).

LADOiS

Meu lado que ama, meu lado que odeia.
Um lado quer, o outro esperneia.
Meu lado rancor, meu lado perdão.
Um lado que grita, o outro que é em vão.
Meu lado adulta, meu lado criança.
Um lado desiste, o outro é esperança.
Meu lado que é bom, meu lado que é mal.
Um lado é comum, o outro anormal.
Meu lado que ve, meu lado que é cego.
Um lado admiro, o outro eu nego.
Meu lado imatura, meu lado que é pronto.
O lado que quero, o lado que encontro.
Meu lado que é rico, meu lado que é pobre.
Um lado engrandece, o outro me engole.
Meu lado que ri, meu lado que chora.
Uma lado desdenha, o outro implora.
Meu lado que fica, meu lado que vai.
Um lado que é cheio, o outro que esvai.
Meu lado com fé, meu lado ateu.
São sempre dois lados, mas ambos sou eu.

Antonia

Quando ela saiu de casa não tinha pretensão alguma de coisa qualquer fazer. Parou em frente ao mar e sentiu-se pequena ao observá-lo. O brilho da lua refletia o mar. E o brilho de seus olhos refletia a alma. Ninguém sabia que ela estava de partida. Não mudava de país, cidade, bairro, endereço. O que se despedia era Antonia. Morria. Mas apenas uma parte dela. Não por sua escolha consciente. Talvez por desistência. O amor ocupava cada pedaço de seu corpo. O vazio, também. Vagueava a vida. Sem ver. Estava cega. Estava entregue. Se Deus tivesse a levado e não apenas sua alma...

Gosto de ti

Gosto de você.
Do seu jeito.
Meio insano, meio tirano, meio torto.
Engraçado, atrapalhado, meio louco.
Meio estranho, que se entranha, meio morto.


Gosto de você.
Do seu jeito.
Quando dança, quando canta, quando fala.
Que me encanta, que me espanta, que me intala.
Se me abraça, se me beija ou se me mata.
Quando chega e me engana e me maltrata.

Sem título

E ja não era mais época dela ter aquele tipo de recordação. Enquanto mudava os canais, como se procurasse alguma coisa para assistir, na verdade não queria era assistir nada. Era como se estivesse absorta dentro de seus pensamentos, mas também sem saber muito bem o que pensava. Aquela confusão mental nada mais era que, que... nem mesmo ela sabia dizer.

Desde novinha sempre soube o que queria. Já podia fechar os olhos e ouvir os badalos do sino da igreja tocando. Mas eram seus próprios olhos que fechava ou eram os olhos da família, dos amigos, do mundo convencional? Não importava que olhos eram, o que importava era que quando surgia o breu do tocar das pálpebras, havia um sonho. E se havia um sonho, havia uma certeza.

Relacionamentos não eram um problema, tampouco uma solução. Sempre levara seus amores de uma forma pacata, sensata e correta. Correta, é claro, dentro da concepção de correto que havia criado em sua cabeça.
Sendo sempre aquela pessoa coerente e racional, nunca pensou  que se apaixonaria dessa forma por um alguém tão diferente, ou tão igual a ela.

21hrs da noite, chegou no bar a que ia sempre com os seus amigos. Conversou com várias pessoas, mas não sabia que se apaixonaria por um certo alguém que se misturava no meio da multidão. Foi embora. Alguns dias depois já tinha uma relação de afeto  que foi crescendo cada dia, despercebidamente.
Era tão inusitada aquela paixão, que aquela forma pacata, sensata e correta de se relacionar transformou-se em palpitações, calores, saudades e angústia. As horas começaram a passar mais devagar e aquele sentimento crescia. Mas como era possível ter se apaixonado por alguém como aquela pessoa?

Nada mais disso importava. O porquê, o como, o quando... Para que cogitar no que haveria se transformado se nada daquilo tivesse acontecido? Ela era quem era, e não precisava de uma definição, de um rótulo. Ou, pelo menos, ela queria acreditar que não precisava.
Tentava medir o tempo que havia passado, o tempo que havia perdido. Tentava medir o medo que havia sentido e que sentia.

A decepção havia tomado conta de seu ser. Era, praticamente, a mágoa personificada. Ser traída era uma coisa que não pensava ser possível, não naquelas circunstâncias. Havia sido traída pelo seu amor, mas também havia traído todos os conceitos que guardava dentro de si, todas as certezas que havia tido algum dia.

Por aquele amor, o incorreto tornou-se correto, ruim tornou-se bom, minutos tornaram-se horas e as horas tornaram-se minutos, preto virou branco, “fique aqui comigo” tornou-se “vamos fugir juntos?”, “me liga amanha?” tornou-se “não saia de perto de mim”. Mas mais do que isso, “tenha mais amor próprio” tornou-se “eu te amo”, “a monogamia nao existe” tornou-se “eu te respeito” e “não me traia” tornou-se “eu te perdoo”.

Como seria isso possível? O mundo estava às avessas. Enquanto tentava segurar todas as verdades em suas mãos elas escorriam por entre os dedos.

E ja não era mais época dela ter aquele tipo de recordação. Enquanto mudava os canais, como se procurasse alguma coisa para assistir, na verdade não queria era assistir nada. É como se estivesse absorta dentro de seus pensamentos, mas também sem saber muito bem o que pensava. Aquela confusão mental nada mais era que, que...  a busca pela verdade.

Mas ela já era uma mulher experiente e sabia que a verdade já não mais existia. A fidelidade, o bom, o certo, eram criaçoes. E o ser era apenas estar. A única certeza que tinha naquele momento era o tempo, a transformação e a formação de novos conceitos. E quando fechou os olhos para dormir, não queria mais nada disso, queria apenas ser feliz.

Conversa com ele

- Amém... Aonde você está indo? Não percebe que está andando na contramão novamente? Olhe para frente. Não tenha medo. Eu sei que parece difícil. Irei te ajudar. Espera muito de mim. As vezes pareço não te ouvir. Não me entenda mal! Quero que pense. Quero que sinta. Quero que ouse. Quero que espere mais de você! Não é você que gosta do difícil? Cadê sua coragem? Esqueceu em algum lugar? Refaça seu caminho. Encontre-a. Sei que você consegue. Entendeu? Coloque isso na sua cabeça. Você consegue! Você consegue! Saia dessa cama, se descubra. Se descubra. Está ficando mais calma? Respire fundo. Vai dar tudo certo. Estaremos juntos nessa.  Eu aqui em cima, você, aí embaixo.

Você (eu)

Paro. Penso. Questiono. Exito.
Respiro. Angustío. Choro. Alivío.
Durmo. Acordo. Dúvido. Me importo.
Me perco. Me acho. Sorrío e espero.


Te encontro.
Me aflita, me testa, me olha e se abesta.
Me ama e me engana.
Mas mesmo que insana,
É a mim que desejas.